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segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

ENGAJAMENTO LITERÁRIO, PARTE II



Mas, como disse no post anterior: a noção de engajamento ainda é entendida pela maioria como engajamento político de esquerda
Me lembro que, quando comecei a faculdade de Letras, em 1998, assimilei muito rápida e levianamente a ideia da "função" da obra literária: o "despertar a consciência" do leitor para a realidade de luta de classes, e a necessidade, então, de trabalhar pela sua superação. Para mim, não havia nada que prestasse fora desse quadro. 
Ora, é forçoso notar que a maioria das obras literárias está, de fato, fora desse quadro. É, ainda, forçoso notar que certos críticos tentam trazer, a golpes de marreta, obras de sua predileção para esse quadro, a despeito da visível deformação que têm de impor a elas. Para dar exemplos, poderia citar Dom Quixote, Os sofrimentos do jovem Werther, ou mesmo, um tanto polemicamente, A montanha mágica e Madame Bovary, este último, como membro, protótipo perfeito, da escola realista, mas um caso de grande complexidade que extrapola qualquer visão ideológica que se lhe tente impor. Há, mesmo, autores essenciais cuja obra inteira muito dificilmente suportaria o enquadramento marxista: falo, principalmente, de Albert Camus. Mas poderia citar também Clarice Lispector.
O grande problema desse caso é que os críticos marxistas não concebem absolutamente nenhuma verdade fora do modelo de que se servem. É o que está na grade, e ponto final. Cito, para ilustração, o caso bem óbvio de Roberto Schwarz e sua análise do episódio "A flor da moita", acerca da personagem Eugênia, das Memórias póstumas de Brás Cubas. A moça, como se sabe, é coxa, e Brás Cubas a trata do modo pequeno, mesquinho e vil digno de sua personalidade. Pois bem. R. Schwarz coloca em primeiro plano o fato de ela ser pobre, e, indo além, sobrepõe a pobreza ao defeito físico, praticamente anulando este último. Como Brás Cubas chega a ficar noivo, mais adiante no livro, de uma moça pobre porém sem qualquer problema físico, creio que fica claro a forçada de mão de R. Schwarz. 
Isto posto, a grade marxista proporciona sim interpretações interessantes do romance de Machado de Assis. Mas há muito fora do foco dela.
Se nossos intelectuais, nossos homens grandes, R. Schwarz entre eles (sem qualquer ironia), admitissem que seu método não é universal, o ganho, para todos, leitores e escritores, seria enorme.


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